Ir para o conteúdo Ir para o menu Ir para a Busca

AGÊNCIA DE

Notícias

Boas lições

“Às crianças, tudo a que têm direito”

Em Paulista (PE), lar de acolhimento a crianças em vulnerabilidade garante acesso à educação desde a pré-escola, com suporte psicopedagógico, esportes e afeto


Atividades de pré-escola fazem parte do Projeto Educacional Maná do Céu, que contempla 40 crianças e adolescentes em Paulista (PE). Foto: Arquivo Lar Maná

Por Wallace Cardozo, Rede Galápagos, Salvador (BA)

Vinte e nove  crianças e adolescentes moram no Lar de Acolhimento e Reintegração Maná, em Paulista, Pernambuco. A origem bíblica do nome é influência de uma igreja, que cedeu a área onde a instituição funciona. Desde 2008, quando o espaço foi fundado, mais de 400 crianças e adolescentes passaram por lá. Eles chegam encaminhados pela Vara da Infância e Juventude do município de Paulista ou por intermédio do Conselho Tutelar porque estão em situação de vulnerabilidade social ou sob medida de proteção de acolhimento institucional. A casa foi a primeira — e, durante muito tempo, a única — entidade com essa finalidade no município, que tem mais de 300 mil habitantes.

Hoje, o Lar Maná recebe doações e tem convênios com a prefeitura de Paulista e o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA). Mesmo assim, os desafios para manter o funcionamento do espaço só aumentam. “Em 2016, além das despesas básicas como alimentação e higiene, tínhamos 15 funcionários. Hoje, com o mesmo apoio da prefeitura, conseguimos pagar apenas 7”, lamenta Ana Valéria Sande, diretora executiva da instituição. Ela conta que quase precisou fechar as portas em quatro oportunidades.

A ausência de creches no município, que faz parte da região metropolitana do Recife, representava uma dificuldade. “As crianças em idade escolar iam à escola e as pequenas ficavam aqui com as cuidadoras. Acabavam não tendo contato com a pedagogia, a aprendizagem e o desenvolvimento.” A partir desse problema, nasceu a ideia do Projeto Educacional Maná do Céu, em que estava prevista a promoção do acesso das crianças pequenas às atividades da pré-escola. 

O projeto foi selecionado no Edital Fundos da Infância e da Adolescência, do Itaú Social, e está sendo executado em 2022. O edital é parte do programa IR Cidadão, que incentiva os colaboradores do Itaú a destinar parte de seu imposto de renda devido aos Fundos da Infância e da Adolescência (FIAs). No preenchimento da declaração do imposto, qualquer contribuinte pode destinar até 3% do valor devido aos FIAs, ação que também é estimulada pelo Itaú Social.

“Esse projeto só é possível com apoio”. Com brilho nos olhos, Ana Valéria enche a boca para falar sobre o Maná do Céu. A preocupação com o desenvolvimento das crianças pequenas era evidente. De acordo com o relato da diretora, o Lar chegou a ter pessoas trabalhando nessa função de forma voluntária, o que não se manteve durante muito tempo. “O acesso até aqui é muito difícil. Estamos numa zona rural e o ônibus para a um quilômetro e meio de distância. Tem que pôr o pé no barro ou vir de carro próprio. Mas, quando o voluntário vem e precisa colocar o seu carro na lama, às vezes não quer vir mais”, lamenta.

Por causa do projeto, as crianças do Lar agora têm profissionais como pedagoga, assistente e psicopedagoga. Pela manhã, quando as maiores partem rumo à escola, as menores já estão terminando de se aprontar no andar de cima, onde ficam os dormitórios.

“As crianças de um a quatro anos descem de bolsinha, fardinha, como se estivessem indo para a escolinha. E estão”, conta a diretora-coruja. Além das atividades pedagógicas, as crianças passam por um acompanhamento inicial de quatro sessões para avaliar a manifestação de possíveis dificuldades de aprendizagem. Depois, quando necessário, é elaborado um plano de intervenção para cada caso.

Decoração da festa para os aniversariantes do mês de maio. Os temas foram escolhidos pelas crianças. Foto: Reprodução do site Lar Maná

Esse é o trabalho de Lusileide Rodrigues, psicopedagoga da instituição. “Precisamos observar alguns aspectos, como as coordenações motoras fina e ampla. Na psicopedagogia, podemos identificar sintomas de algum transtorno para fazermos os devidos encaminhamentos”, explica. Segundo ela, o fato de as crianças do Maná serem oriundas de contextos de vulnerabilidade demanda um olhar ainda mais atencioso e sensível. “Chorei quando descobri que fomos contemplados pelo edital porque esse trabalho é de grande importância para nós e para as crianças.”

O projeto Maná do Céu contempla as crianças maiores com suporte pedagógico e reforço escolar no contraturno, além de aulas de informática. Foram adquiridos quatro computadores para a atividade, que é oferecida duas vezes por semana para as crianças acolhidas pela instituição e outras 11 que moram na comunidade de Chã da Mangabeira, onde fica o Lar Maná. Além disso, as crianças da casa passaram a ser incentivadas a praticar esportes de maneira regular em 2020, e desde então a despesa anual com saúde foi reduzida em 80%. “Às vezes os alunos chegam à aula de informática de sunga porque vieram direto da natação. Até eu queria ter uma rotina dessa”, brinca Paulo Silva, pedagogo e professor de informática.

A diretora executiva da casa de acolhimento, Ana Valéria, diz que já consegue ver um cenário diferente em relação a um passado recente. Diferente para melhor. Ela entende a importância que o acesso à educação de qualidade pode ter na vida das pessoas quando ofertado desde cedo. Justamente por isso, faz questão de que a equipe se divida para frequentar todas as reuniões de responsáveis, nas quatro instituições de ensino em que as crianças estudam. “As escolas dizem que seria ótimo se os pais fossem como nós em relação ao acompanhamento das crianças.”

Voltando a falar sobre a rotina, uma analogia que a define bem: “É como se fosse uma família numa casa, mas com 29 crianças”. Dão bastante trabalho, mas também muita felicidade. Cada novo aprendizado é motivo de comemoração e as conquistas também são celebradas em grupo. Mas não para por aí. “Todos os aniversários são comemorados com festa e com tudo a que as crianças têm direito. Elas vêm de famílias desestruturadas e disfuncionais e aqui tentamos suprir o que não tiveram em casa.” Em maio, a festa teve como temas A Bela e a Fera e Cobra Kai, como publicado no jornalzinho mensal da instituição. Os aniversariantes fizeram seus pedidos. Ana Valéria fez uma promessa: “Tudo isso com o Maná do Céu é só o início. Vamos continuar com os resultados”.

Saiba mais

Leia mais

Assine nossa newsletter

Com ela você fica por dentro de oportunidades como cursos, eventos e conhece histórias inspiradoras sobre profissionais da educação, famílias e organizações da sociedade civil.