

Por Wallace Cardozo, Rede Galápagos, Salvador
Depoimento de Tamires Lopes, professora, mãe de dois filhos, pós-graduada em matemática e suas tecnologias, especialista em matemática financeira e em metodologia do ensino da matemática — e cursista do Polo
Em uma palestra, ouvi falar sobre a pesquisadora Jo Boaler e o seu trabalho com novas perspectivas possíveis para o ensino da matemática. Pesquisei e descobri o Mentalidades Matemáticas. Tudo parecia fazer muito sentido. Estava ansiosa para compartilhar tudo aquilo com os professores do ensino fundamental, os quais oriento para o ensino da disciplina. Logo me inscrevi no curso Conhecendo as Mentalidades Matemáticas para mergulhar um pouco mais no universo da metodologia.
Eu já pensava muito sobre os processos criativos no ensino e na aprendizagem da matemática. Dou aula para os três anos do ensino médio e para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e percebo que os estudantes vão deixando a criatividade de lado com o avançar da idade.
Certo dia, eu estava acompanhando uma obra aqui em casa. Percebi que o pedreiro havia esquecido o esquadro, ferramenta importante para a medição dos ângulos em uma construção. Prestei ainda mais atenção. Ele, então, cortou dois pedaços de madeira, um com 60 e outro com 80 centímetros de comprimento. Observou. Pensou um pouco. Cortou um terceiro pedaço, este com 1 metro de comprimento. Uniu as três partes, formando um triângulo retângulo. Ou um esquadro, que era do que ele precisava naquele momento.
Perguntei se ele sabia realizar operações matemáticas e ele respondeu que não. Na verdade, apenas conseguia assinar o próprio nome. Ficou surpreso quando falei que ele tinha acabado de aplicar, demonstrando muito domínio, um conceito que os estudantes costumam ter dificuldade para aprender: “A soma do quadrado dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa”. Quanta criatividade e imaginação são necessárias para entender isso com pedaços de madeira?
Tudo fez ainda mais sentido. A problemática não está necessariamente na idade dos estudantes, mas no estímulo correto para despertar o seu lado criativo. Alguns dos meus alunos também trabalham em obras. Experimentei ensinar a regra de três utilizando seus próprios conhecimentos práticos de proporção. “Quantos baldes d’água?” e “Qual a quantidade de cimento?” foram algumas das provocações que evidenciaram que eles já sabiam a regra de três! A melhor parte de explorar a criatividade dos estudantes é perceber a infinidade de vias que pessoas diferentes podem apresentar para entender um mesmo problema e chegar à mesma resposta.
Como professora de matemática, uns dos meus principais desafios é contornar as deficiências de aprendizagem com as quais os estudantes chegam. A pandemia agravou ainda mais essa defasagem. Frequentemente, preciso adaptar meu planejamento por precisar de uma quantidade maior de aulas do que as previstas para determinado conteúdo. Conhecer o Mentalidades Matemáticas foi fundamental porque aprendi sobre a importância dos erros. Por meio deles, consigo saber quais as fragilidades em que preciso prestar mais atenção.
É muito efetivo mostrar para que os conceitos que trabalhamos na sala de aula podem ser importantes. Precisamos da matemática em vários momentos do dia, como para assistir a um noticiário e entender como aqueles gráficos sobre inflação e taxa de juros impactam nossa vida.
Existe um pânico generalizado em torno da matemática. Até nós, docentes, acabamos recebendo olhares angustiados logo que nos apresentamos como professores da disciplina. Às vezes, o que assusta é a forma de falar sobre os assuntos. Em alguns momentos, percebi que havia uma questão com a leitura e a interpretação do enunciado, não com o conceito matemático. É hora de desmistificar a matemática e encorajar o uso da criatividade. Nunca se sabe quando precisaremos improvisar um esquadro.
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