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Arte, atenção e vínculo

Escola municipal de Fortaleza promove experiências de arte-educação que estimulam a sensibilidade e ajudam a enfrentar consequências da pandemia


Anna Vitória Moraes, à esquerda, aluna do 9º ano, com a colega Sarah Venceslau, relata que se sentiu acolhida quando mudou de escola. Foto: Giselly Corrêa Barata

Por Giselly Corrêa Barata, Rede Galápagos, Fortaleza (CE)

“Arte não é só para formar artistas, mas pessoas, cidadãos”, inicia Getsêmane de Oliveira Machado, o artista-professor. Licenciado em teatro e publicitário, há oito anos ministra a disciplina de ensino artístico na rede municipal de educação em Fortaleza, no Ceará. Na Escola Municipal de Ensino Fundamental João Estanislau Façanha, localizada no bairro Jardim Cearense, na capital cearense, arte e educação se unem para contribuir para o aprimoramento de habilidades socioemocionais e explorar novas sensibilidades dos estudantes, a maioria na faixa etária de 11 a 15 anos. 

Entrar na escola e visualizar adolescentes tendo uma aula ao ar livre, realizando intervenções em muros, performances e peças teatrais virou rotina nas aulas de arte. “É sair da lógica mecânica para a criativa”, define Getsêmane. Para isso, ele faz uso de diferentes linguagens artísticas, que extrapolam até mesmo sua diversificada formação em artes visuais, plásticas, teatro, literatura e outras linguagens.

A visão está alinhada ao que preconiza a Base Nacional Comum Curricular (2017), que sugere como uma das competências gerais da educação básica “valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-cultural”.

E foi por meio da arte que a estudante Anna Vitória Moraes, de 15 anos, aluna do 9º ano do ensino fundamental, se sentiu acolhida, após mudar de escola neste ano. Segundo conta, sempre teve interesse por atividades criativas e encontrou na iniciativa uma forma de socializar, se expressar melhor e até mesmo resolver conflitos. 

As iniciativas partem do princípio de que é preciso ir além da sala de aula convencional, valorizando a sensibilidade e a subjetividade de cada estudante. Para tanto, ele conta com apoio de um grupo formado por universitários, graduandos em licenciatura em teatro, da Universidade Federal do Ceará.

Getsêmane de Oliveira Machado, professor de arte na rede municipal de Fortaleza, no centro, com estudantes da Universidade Federal de Fortaleza em iniciação à docência: “Sair da lógica mecânica para a criativa”. Foto: Giselly Corrêa Barata

Desde maio, a parceria acontece por meio do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), com estudantes do 2º ao 4º período do curso. Para parte deles, trata-se da primeira experiência em sala de aula. Integram a equipe Ana Luisa Lopes, Samanta Oliveira Soares, Bárbara Queiroz, Bruno de Sousa Veras, Brian Porto, Danilo Gonçalves e Davyd Fonteneles. 

Com cerca de 11.139 habitantes, segundo o Censo 2022 do IBGE, o Jardim Cearense conta com 1.824 crianças e adolescentes entre 10 e 18 anos. Além do público local, a Escola João Estanislau Façanha recebe alunos de bairros vizinhos. Diante de um contexto marcado pela vulnerabilidade social, as marcas se apresentam mesmo durante as aulas, como é o caso dos jogos de teatro e improvisação. 

“Quando a temática é livre, sem que a gente diga nada, aparecem cenas de violência. É uma memória, está na cultura, no inconsciente. E quando identificamos isso, passamos a tratar como um objetivo, como uma grande meta. Estamos aqui para criar memórias, outras memórias, e pensar: o que nós dialogamos com eles que está além desse imaginário?”, provoca Getsêmane Machado.

Com a pandemia e os períodos de isolamento social, a rede municipal aderiu à educação à distância, para manter suas atividades. Hoje, dois anos após o retorno às salas de aula, as consequências desse período estão presentes tanto para quem ensina quanto para quem aprende. 

“Socialmente a pandemia trouxe um desafio para o nosso dia a dia que também tem a ver com a questão da violência”, pontua o professor. Diante de tantos desafios, o que fazer? Criar e adotar novas práticas que respondam a esses desafios é o que tem sido o papel desempenhado pela educação artística. Veja alguns exemplos no quadro a seguir.

Caixa de práticas

Alguns formatos de atividades aplicadas na Emef João Estanislau Façanha 

“Se eu fosse…”
A partir de perguntas básicas, estudantes realizam criações artísticas: “se eu fosse uma cor, se eu fosse uma comida, se eu fosse um objeto, uma memória…” Ou, ainda, indagações mais existenciais: “se eu fosse um medo, um sonho, uma saudade”… As respostas geraram desenhos, pinturas, fotografias, oralidades e outras formas de expressão. Com a iniciativa, os estudantes puderam compartilhar suas subjetividades, desejos, experiências e expectativas. 

“Que mundo me aguarda lá fora?”
Desafio de fotos dentro de casa na pandemia. Cada estudante compartilhou uma por dia, durante uma semana. A única regra, até então, era não aparecer na imagem. Investigou-se, portanto, que espaços eram significativos para eles. Qual a relação dos estudantes com a tecnologia e com o ambiente externo no cenário de isolamento social? Os alunos relataram menor sensação de solidão e estímulo à criatividade, enquanto o professor pôde perceber como a cultura tecnológica está presente na rotina dos adolescentes. 

Espaço EsverdeAr-te
Motivo de orgulho para a escola, o Espaço EsverdeAr-te propõe agregar sustentabilidade, criatividade e educação estética. Antes sem uso, o espaço foi recém-contemplado no edital Boas Práticas, promovido pela prefeitura de Fortaleza, e se prepara para dar lugar a um ambiente multiúso de arte na escola, ao ar livre e conectado com a natureza local, vinculado à disciplina de arte no contexto do ensino fundamental – anos finais. A proposta é que os alunos sejam os principais propositores de arte dessa sala de aula.

Outros olhares sobre a educação artística
O que forma um professor? Muito além da formação acadêmica, defendeu o educador pernambucano Paulo Freire, educar é um ato de amor. Mas está longe de ser algo inato. Para Bárbara Queiroz, integrante do Pibid e graduanda em teatro, a docência tem se tornado uma opção a partir da experiência em sala de aula na escola. 

“Entrei no teatro querendo ser dubladora. Não tinha o menor interesse na questão da licenciatura, porque as aulas que tive na escola eram somente de história da arte, trazendo períodos históricos e seus principais artistas. Isso não despertava meu interesse”, relembra a jovem, que mudou a perspectiva com a participação no projeto. 

“Mas me apaixonei pela parte de você entrar na sala e fazer diferença na vida de alguém, porque eu tô trazendo a experiência que não tive e não só aprendendo sobre arte na teoria, mas vivendo aquilo ali”, define Bárbara.

O estudante Danilo Gonçalves, que integra o grupo, observava a desvalorização do ensino artístico na educação básica. “Então eu vim para cá com a ideia de sempre buscar o meu eu criativo, de trazer uma aula criativa e dinâmica”, conta Danilo. “Quero ajudá-los a entender que têm de, sem deixar de se importar com as outras matérias, ver a arte como um bom caminho para se expressar no mundo.”

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