

Por Wallace Cardozo, Rede Galápagos, Salvador (BA)
Todos os docentes ouvidos por um levantamento entendem que bons professores podem transformar a vida de uma pessoa. Ao mesmo tempo, 93% discordam da afirmação de que professores no Brasil são tão valorizados quanto são médicos, engenheiros ou advogados. O sentimento de desvalorização da profissão se justifica ao longo das páginas seguintes da Pesquisa de opinião com professores e professoras de escolas públicas, em que são citados fatores como remuneração, condições de trabalho e equilíbrio entre vida pessoal e vida profissional.
O estudo fez parte da iniciativa Educação Já 2022, da organização Todos pela Educação, e contou com apoio do Itaú Social, do Instituto Península e do Profissão Docente. Foram ouvidos 6.700 professores e professoras de escolas ativas de ensino regular da rede pública. Participaram da pesquisa docentes das cinco regiões do Brasil, abrangendo os anos iniciais e os finais do ensino fundamental e o ensino médio. Eles responderam a perguntas sobre temas como satisfação profissional, plano de carreira, formação continuada e valorização profissional.
“Não há quem discorde de que o professor é uma figura muito importante na sociedade. Mas a valorização pretendida é uma compreensão coletiva de que a carreira precisa ser mais atrativa, com condições de trabalho adequadas e ofertas consistentes e coerentes de desenvolvimento profissional”, afirma Mariana Breim, diretora de políticas educacionais e pesquisa do Instituto Península. Uma das principais reivindicações da classe diz respeito ao piso salarial, que, apesar de estabelecido pela Lei nº 11.738, ainda é descumprido por alguns estados e municípios, como afirma Marcos Marques, professor de filosofia e dirigente sindical no Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Lauro de Freitas (Asprolf).
O educador destaca que ainda não se atendeu à meta 17 do Plano Nacional de Educação (PNE). O texto define que, até 2024, o salário dos profissionais de educação deve ser equiparado ao de outros profissionais de nível superior. Em 2021, a relação percentual entre o rendimento bruto médio mensal dos professores e o dos demais profissionais com mesma escolaridade equivalia a 82,5%, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua daquele ano. No mesmo período, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou um estudo que mostrou que, entre os 40 países pesquisados, o Brasil tem a menor média de salário inicial dos professores dos anos finais do ensino fundamental.
“Essa subvalorização passa, ainda, por questões como gênero e raça. Quanto menor a escolaridade dos alunos atendidos, maior o número de professoras mulheres, em sua maioria negras”, aponta Marcos. O mesmo relatório da OCDE confirma a fala do professor, indicando que docentes da educação infantil são aqueles com menor remuneração, enquanto os do ensino superior são os que ganham melhor. “No ensino médio, já se registra maior quantidade de professores homens, e nas universidades há uma maioria de homens brancos, com salários que não se comparam aos pagos na educação básica.”
É comum ouvir de pessoas mais velhas que a educação pública já foi muito melhor no Brasil, em termos de qualidade do ensino oferecido. Marcos acredita que isso se dava porque os professores eram mais valorizados, já que nem todas as camadas da população tinham acesso à educação. “Naquele momento, os professores atendiam às elites e eram tidos também como uma elite intelectual do país. A partir da promulgação da Constituição de 1988, quando todas as pessoas passaram a ter direito à educação, houve uma desvalorização dessa classe”, observa.

Na pesquisa, 76% dos docentes ouvidos concordaram que um bom professor consegue bons resultados mesmo em condições de trabalho desfavoráveis. Entretanto, 7 em cada 10 disseram que se sentem estressados no trabalho por causa de uma excessiva cobrança por resultados, e 65% entendem que ser um bom professor depende mais de formação do que de vocação — mas 24% afirmam receber raramente ou não receber formação continuada para trabalhar com temáticas relativas à diversidade e à educação inclusiva.
Para Gabriel Corrêa, diretor de políticas públicas do Todos pela Educação, “a pesquisa reforça, a partir da voz dos próprios professores, a necessidade de melhorias na formação docente, que é uma pauta central para a valorização da profissão e a garantia de uma educação de qualidade para todos”.
As reivindicações dos professores por valorização e melhores condições de trabalho costumam ser pautadas nos noticiários em momentos de greves, paralisações e manifestações da classe, mas a pesquisa evidencia que os profissionais da educação estão dispostos a falar sobre o que deve receber atenção dos gestores. Apoio psicológico, melhora na infraestrutura das escolas e ampliação do uso de tecnologia nas instituições de ensino foram algumas sugestões defendidas pelos professores ouvidos. Marcos faz questão de celebrar as conquistas que já foram alcançadas e diz acreditar em perspectivas otimistas para o futuro. “Os sindicatos atuam durante todo o ano, em prol de melhorias para professores e estudantes. Para além das pautas corporativas, como as questões salariais, o que essas agremiações defendem, no fim das contas, é uma educação de qualidade.”
Saiba mais
- Pesquisa de opinião com professores e professoras de escolas públicas
- Observatório do Plano Nacional de Educação
- “A avaliação é como um espelho que reflete a realidade”
- “Ser professora é um estilo de vida”
- MAGDA SOARES — “Fui uma profissional de formar professores”