A colcha de retalhos, geralmente costurada por mãos experientes, é uma tradição em muitos lares Brasil afora. As linhas emendam pedaço por pedaço de tecidos repletos de histórias, transformando-os numa grande peça que traz calor e conforto a quem precisa.
Os retalhos, quando costurados pelas linhas, carregam um valor inestimável, por causa de sua utilidade, beleza e, principalmente, devido ao afeto de quem produziu. Essa é uma analogia simples, mas que ilustra a importância da união na atuação das organizações da sociedade civil, para garantir maior impacto social no território onde estão.
Quando atuam em rede, as organizações e as pessoas compreendem melhor as questões e necessidades territoriais e ampliam suas percepções sobre a causa que abraçam, para além dos limites da instituição em que atuam, trazendo diferentes visões para desafios complexos da nossa sociedade.
Um dos problemas que ainda persistem no Brasil é a gravidez na adolescência, que equivale a 57% das gestações, segundo o Fundo de População das Nações Unidas divulgado neste ano. Tornar-se mãe nessa fase pode representar grande risco para a evasão escolar de meninas. Diante desse desafio, três organizações de Serra, no Espírito Santo, desenvolveram, conjuntamente, o projeto Mente Saudável Feminina, para evitar que meninas grávidas ou que deram à luz recentemente abandonassem os estudos.
Para chegar a uma proposta que realmente dialogasse com o público (meninas entre 14 e 18 anos), os integrantes das organizações se uniram para formular estratégias e avaliar cada etapa. A partir dessa troca, foram trabalhadas dimensões como participação, horizontalidade, diálogo, tomada de decisão coletiva, mediação de conflitos e respeito à pluralidade de valores.
As organizações de Serra firmaram uma parceria com a Escola Vila Nova de Colares, e o resultado foi altamente positivo. No início do projeto, a maioria das alunas respondeu “sim” quando questionada se desejava abandonar os estudos; ao final, todas disseram que não desistiriam da sua trajetória escolar.
Entre outros fatores, o sucesso do projeto capixaba é atribuído à valorização do coletivo, que considera toda a diversidade e conhecimento de diferentes indivíduos e instituições. Esses espaços de troca são oportunidades de uma aprendizagem e apoio mútuos, que reverberam no fortalecimento da própria organização participante.
— Ninguém sabe tanto que não tenha o que aprender, e ninguém sabe tão pouco que não possa ensinar — afirmou o filósofo Blaise Pascal.
Ou, como explicou mais recentemente o também filósofo Pierre Lévy, as inteligências individuais somadas e compartilhadas resultam em uma aprendizagem coletiva — e a tecnologia está aí para potencializar esse processo.
O potencial da atuação de forma conjunta é cada vez mais reconhecido pela sociedade, mesmo pelo investimento social privado. Segundo o Censo GIFE 2020, 93% dos financiadores que trabalham em redes ou grupos entendem que a ação compartilhada ajuda no alcance de objetivos e propósitos comuns. Constatou-se que 78% dos investidores destinaram recursos para mobilização, conscientização e articulação de atores, e 73% para articulação e fortalecimento de redes.
O lema “juntos somos mais fortes” nunca teve tanta força e, num momento em que estamos tentando nos recuperar dos prejuízos causados pela pandemia, tornou-se essencial caminharmos lado a lado. Assim, as organizações se tornam mais representativas para articular com outros setores, como o poder público, além de garantir mais sustentabilidade em suas ações e maior participação da sociedade. Unidas, o impacto social se expande, e todos se fortalecem.
*Originalmente publicado no O Globo no dia 20 de setembro de 2022